Caramelo
Caramelo é a primeira produção que a Migdal Filmes, conhecida por obras como Minha Mãe é uma Peça e Nosso Lar, realiza em conjunto com a Netflix. É o terceiro longa-metragem escrito pelo diretor Diego Freitas, sendo o primeiro com lançamento internacional, e traz a promessa de contar uma história que fosse ao mesmo tempo brasileira, mas com apelo universal. O longa alcançou o top 3 global da Netflix e, em muitos países, chegou à posição de filme mais assistido na semana de lançamento.
Pedro (Rafael Vitti) é um jovem chef promissor que está prestes a concretizar o sonho de abrir seu próprio restaurante quando um diagnóstico inesperado o obriga a repensar tudo. No fundo da crise, ele encontra uma nova razão para seguir em frente ao fazer amizade com Caramelo (Amendoim), um vira-lata caramelo que reflete a simplicidade e a tenacidade da vida. Juntos, eles embarcam em uma jornada de superação, afeto e descoberta do valor dos pequenos gestos, enquanto Pedro redescobre o significado de viver e amar o presente.
O objetivo de uma produção esteticamente brasileira é bem cumprido. O filme explora diversos cenários e elementos simbólicos do país, ainda que em alguns momentos force um pouco a barra. É a raça do cachorro, o nome dos personagens, os cenários e a trilha sonora: uma produção que não tem vergonha de ser brasileira e traz o país aos holofotes com um lançamento de impacto na maior plataforma de streaming do mundo.
Apesar de toda a sua brasilidade, a história de uma pessoa e seu cachorro é tão antiga quanto o tempo e não depende do entendimento de referências culturais para ser apreciada por espectadores no mundo inteiro. Com vários momentos capazes de arrancar lágrimas, risadas e recuperar memórias de todos os pais de pets, Caramelo consegue despertar uma gama de emoções que nos mantêm focados e conectados com a história e com a relação de Pedro e seu cão.
A direção do longa alcança alguns feitos surpreendentes. A produção envolveu mais de 60 cachorros resgatados por ONGs, e o trabalho de câmera para capturar certas cenas é melhor do que o de muitas produções internacionais com mais investimento. O mais importante é que o trabalho com os animais faz toda a diferença: é criado um relacionamento lindo entre Pedro e Caramelo, com o qual todo dono de cachorro será capaz de se identificar.
Infelizmente, se Diego Freitas capricha na direção, o roteiro, assinado por mais dois profissionais, deixa a desejar em vários momentos. O arco emocional e o desenvolvimento bem cadenciado estão presentes, mas há diversas linhas de diálogo que não soam naturais e acabam prejudicando a credibilidade da história. Felizmente, para a distribuição internacional, a dublagem ou as legendas em outras línguas devem ser suficientes para mascarar o problema. Freitas se prova um diretor extremamente competente, mas talvez seja melhor voltar a se dedicar a roteiros escritos por outros profissionais.
Rafael Vitti é um dos atores mais talentosos de sua geração, e embora esteja bem na maioria das cenas, ele falha quando tenta demonstrar raiva de Caramelo. Como o animal não é capaz de diferenciar atuação de realidade, quero acreditar que o tom de voz controlado nos momentos de bronca é apenas resultado da peculiaridade de contracenar com um cachorro.
Outro fator importante nessa produção é que, apesar de existir um projeto de lei, parado há alguns anos, para obrigar plataformas de streaming a participarem de produções locais, da mesma forma que canais de TV paga são obrigados a exibir conteúdo nacional, obras como Caramelo atualmente são feitas exclusivamente como forma de explorar e fortalecer a relação com o público brasileiro. Hoje, no país, o maior concorrente da Netflix é a Globoplay, e essa produção não deixa a desejar em nada quando comparada aos longas produzidos pela Globo.
Caramelo é um filme simples e direto que, apesar de não ter um grande orçamento, nos lembra que muitas vezes uma história sincera e bem contada pode ser muito mais impactante do que grandes efeitos especiais e múltiplas narrativas paralelas. Uma obra que representa bem o cinema brasileiro, tanto em suas qualidades quanto em seus defeitos.
Nota: 7/10