A franquia Extermínio, iniciada em 2002 com direção de Danny Boyle e roteiro de Alex Garland, revolucionou o gênero pós-apocalíptico ao apresentar um vírus altamente contagioso que transforma humanos em criaturas violentas. Misturando terror, crítica social e uma estética crua e realista, o longa virou referência. O sucesso abriu caminho para Extermínio 2 (2007), que expandiu o escopo do surto, mas sem o envolvimento direto de Boyle e Garland. Após anos de especulação, a saga retorna com Extermínio: A Evolução, desta vez com os dois nomes originais de volta, prometendo reconectar a história com as raízes autorais que deram identidade à série. O novo capítulo acompanha o mundo décadas após o colapso inicial, questionando como a humanidade sobreviveu, se adaptou ou simplesmente se perdeu ao longo de quase trinta anos de infecção.
Em Extermínio: A Evolução, um grupo de sobreviventes vive isolado em uma ilha segura. Quando um dos membros parte em missão até o continente, descobre um novo mundo cheio de horrores, maravilhas e segredos, onde não apenas os infectados, mas também os humanos, sofreram mudanças assustadoras.
Com o retorno de Alex Garland no roteiro, voltam também suas forças e fragilidades como autor. É necessário um certo nível de suspensão de descrença para se deixar levar. Algumas decisões dos personagens, bem como cenas de ação e diálogos, não resistem à lógica básica e parecem existir mais para o impacto visual do que para a coerência narrativa. Em contrapartida, há uma intensidade emocional notável e uma trajetória pessoal dos protagonistas que sustenta o interesse do início ao fim.
Danny Boyle retorna com uma direção impressionante. Ele não apenas reinsere o espectador nesse universo devastado, como injeta imagens que beiram o delírio, remetendo a clássicos do terror psicológico. Há cenas que não são testemunhadas pelos personagens, mas sim captadas de maneira quase delirante, reforçando o sentimento de colapso mental e social. Os momentos de ação são brutais e eficazes, gerando verdadeira tensão sobre a sobrevivência de quem está em cena. Ainda assim, há um desequilíbrio evidente: o ponto alto da história acontece no meio do filme, e o que segue, apesar de consciente da própria desaceleração, acaba deixando o desfecho com menos força do que deveria.
O elenco é um dos grandes acertos da produção. Mesmo com nomes como Jodie Comer, Aaron Taylor-Johnson e Ralph Fiennes, o destaque inesperado é Alfie Williams, ator mirim de 14 anos. Ele carrega o peso emocional da narrativa com segurança, transformando-se ao longo da trama de uma criança ainda inocente em alguém moldado pela brutalidade desse novo mundo. Sua atuação é um lembrete do quanto histórias de horror podem ser profundamente humanas.
Um ponto de incômodo na experiência é a constante sensação de se estar assistindo a uma adaptação de videogame. O filme introduz diferentes tipos de zumbis com características específicas e níveis distintos de dificuldade, o que acaba funcionando como um artifício para justificar variações de ameaça sem necessidade real de explicação. Essa escolha empobrece um pouco a fluidez do universo proposto, que sempre teve na imprevisibilidade uma de suas forças.
Há também o fator geracional. Após um hiato de quase vinte anos, esse novo capítulo dá início a uma trilogia já confirmada. E, se o final deste primeiro longa é qualquer indício do que está por vir, fica no ar uma certa preocupação. É compreensível a tentativa de estruturar um novo arco, mas a obra termina sem deixar confiança suficiente de que o que virá será satisfatório. Vale o registro de gratidão à Disney por não ter se interessado por terror após adquirir a Fox, permitindo que os direitos da obra fossem devolvidos à Sony. Já basta a Disney estar apagando os filmes da minha infância — pelo menos os que marcaram minha adolescência parecem a salvo por enquanto.
Extermínio: A Evolução é um retorno digno para uma das produções mais influentes do terror moderno. Mesmo com alguns tropeços de ritmo e excesso de regras que funcionariam melhor num jogo do que num filme, o peso emocional das relações humanas, somado à direção precisa e estética marcante de Boyle, resgata com vigor a alma do original. Como introdução para uma nova leva de histórias, cumpre seu papel. Mas para deixar uma boa impressão sobre o que vem a seguir, ainda tem um caminho a percorrer.
Nota: 7/10