A Black List é uma plataforma de Hollywood, estabelecida pela primeira vez em 2005 como uma pesquisa anual dos roteiros não produzidos mais apreciados na indústria cinematográfica. Entre os inúmeros longas que já vieram dessa lista, encontram-se obras famosas e renomadas como Argo, The Revenant (O Regresso) e Juno. O filme desta crítica apareceu na Black List de 2020, portanto já existia uma certa expectativa para o seu lançamento.
Expectativa essa que apenas aumentou quando foi confirmado o retorno de Mel Gibson na direção. Ele já criou uma reputação como diretor; seus projetos sempre foram grandiosos e bem trabalhados, com destaque para The Passion of the Christ (A Paixão de Cristo) e Braveheart (Coração Valente).
Em Ameaça no Ar, um piloto (Mark Wahlberg) é responsável por transportar Madolyn Harris (Michelle Dockery), uma oficial da Força Aérea que acompanha Winston (Topher Grace), um depoente que estava foragido nas montanhas do Alasca. À medida que atravessam as montanhas em pleno voo, a viagem se torna um pesadelo e a tensão aumenta quando, aparentemente, nem todos a bordo são realmente quem dizem ser.
Quase toda a trama se passa dentro de um avião, e todos os clichês que se pode esperar de uma pessoa comum tentando pousar uma aeronave estão presentes. O filme tem um custo de produção baixíssimo para os padrões de Hollywood, batendo a marca de “apenas” dez milhões de dólares. Tendo essa informação em mente, é possível perdoar a falta de qualidade nos efeitos especiais, mas esse é um dos menores problemas que o filme apresenta.
Mark Wahlberg raspou o cabelo para se apresentar como um personagem calvo. A ideia de o personagem possuir essa característica foi do próprio ator e é completamente desnecessária, assim como inúmeras linhas de diálogo que, segundo o diretor, foram improvisadas por Mark. Como se não bastasse a quantidade de absurdos envolvendo o personagem, existe um momento do filme dedicado exclusivamente para tratar a calvície do mesmo como uma grande revelação. Detalhe: o longa é um thriller de ação, não uma comédia.
Topher Grace parece ter voltado no tempo para interpretar Eric Forman, seu antigo personagem da sitcom That '70s Show. A interpretação do ator me convenceu de que todos os profissionais envolvidos no projeto sabiam da qualidade final que o produto teria; não existe esforço algum em manter o suspense e até as falas que deveriam ser sérias são entregues de maneira cômica.
Já Michelle Dockery sofre com o desafio de ter que interpretar a maior quantidade de falas de um roteiro que não possui uma única conversa que soe como um diálogo minimamente real. Existem alguns outros personagens que aparecem na história apenas através de conversas telefônicas com a protagonista, e a sensação é que não são interpretados por atores profissionais. A falta de emoção em falas que deveriam ter impacto é cômica, e a tentativa de reações emocionais da atriz não ajuda a reduzir o estranhamento.
O trabalho de som também é horroroso. Em um momento, as pessoas no avião não conseguem se ouvir por causa do barulho das turbinas na cabine. Depois, elas conseguem conversar tranquilamente sem precisar elevar a voz, enquanto outro personagem está no fundo da aeronave derrubando coisas no chão e fazendo barulho sem ninguém perceber. Os personagens sofrem não apenas de audição seletiva, mas também da total ausência de visão periférica.
A dúvida que fica agora é se a expectativa do público com o próximo projeto de Gibson, A Ressurreição de Cristo, vai se alterar. Como ator, ele não é estranho a filmes de baixo orçamento e qualidade questionável, mas como diretor ele tinha construído uma reputação louvável que agora fica manchada por esse lançamento.
Apesar de todos os problemas, Ameaça no Ar funciona como um filme tão ruim que se torna engraçado. Mesmo sendo um ponto baixo na carreira de todos os profissionais envolvidos, existem aqueles que, como eu, vão se divertir quando, a cada cena, se perguntarem: “quem foi que achou que isso era uma boa ideia?”.
Nota: 2/10