Criado em 1961 por Stan Lee e Jack Kirby, o Quarteto Fantástico não foi apenas o primeiro grupo de heróis da Marvel, mas também o símbolo de uma nova era nas HQs. Uma era em que super-heróis podiam ser falhos, impulsivos e humanos. Ironicamente, no cinema, esses mesmos personagens ficaram marcados por filmes esquecíveis, mal recebidos e até não lançados. Agora, com o grupo finalmente integrando o universo cinematográfico da Marvel, a expectativa era de um recomeço. Mas será que foi isso que aconteceu?
Nos quadrinhos, o grupo marcou o início da chamada Era Marvel. Antes disso, os heróis eram retratados como figuras quase infalíveis: invencíveis, inteligentes, sempre prontos com a resposta certa. Com o Quarteto, Lee e Kirby apostaram em personagens que erravam, sentiam medo, brigavam entre si e lidavam com suas próprias limitações. Essa abordagem revolucionou o mercado editorial e consolidou a Marvel como rival direta da DC Comics.
Já nos cinemas, a história é bem mais conturbada. Houve três filmes neste século com dois elencos diferentes, e nenhum conseguiu emplacar de verdade. Sem contar o longa da década de 90, jamais lançado oficialmente, supostamente produzido apenas para manter os direitos sobre os personagens na 20th Century Fox.
Com a compra da Fox pela Disney em 2019, a entrada do grupo no MCU era apenas questão de tempo. Agora, Quarteto Fantástico: Primeiros Passos chega como parte da fase seis, prometendo ser um dos pilares do novo ciclo da Marvel e peça central nas próximas produções dos Vingadores.
Na nova trama, um grupo de astronautas é exposto a uma tempestade de radiação cósmica durante uma missão experimental, o que provoca transformações extraordinárias. De volta à Terra, cada um descobre habilidades únicas: Reed Richards (Pedro Pascal) ganha a capacidade de esticar o corpo, Susan Storm (Vanessa Kirby) torna-se invisível, Johnny Storm (Joseph Quinn) controla o fogo e pode voar, enquanto Ben Grimm (Ebon Moss-Bachrach) se transforma em uma criatura rochosa de força descomunal. Enquanto tentam entender suas novas condições, o grupo enfrenta ameaças que colocam à prova não apenas seus poderes, mas também sua união como equipe.
Diferente dos filmes anteriores, Primeiros Passos abraça a estética retrofuturista presente nas HQs originais. Os uniformes são fiéis, o design de produção é criativo e o visual geral remete diretamente à fantasia científica da década de 60. É o aspecto mais bem resolvido do longa, e o que mais o diferencia.
Mas se no passado o Quarteto representou a humanização dos super-heróis, o mesmo não pode ser dito aqui. Há tentativas de criar situações emocionalmente complexas, mas tudo soa superficial. É difícil apresentar quatro protagonistas em menos de duas horas, e o roteiro não dá conta. Tocha Humana e o Coisa são apenas sombras de suas versões em outras mídias, e até inferiores aos personagens do filme de 2005. A química entre os atores é excelente, mas o Johnny Storm baladeiro e o Ben Grimm atormentado por sua aparência simplesmente não aparecem.
E personagens mal desenvolvidos costumam ser reflexo de roteiros fracos. O texto de Primeiros Passos é recheado de clichês, com personagens tomando decisões sem justificativa clara. As falas, em muitos momentos, beiram o constrangedor. Só não comprometem completamente porque o elenco principal segura firme, com destaque para Pedro Pascal e Vanessa Kirby, que fazem o possível mesmo nas piores cenas.
Os vilões são desperdiçados. A estreia da Surfista Prateada (Julia Garner) e do Galactus (Ralph Ineson) começa promissora, mas perde força no terceiro ato. E para um filme de super-heróis, há pouquíssimas cenas de combate. Só no final é que vemos o Sr. Fantástico usando seus poderes de forma significativa.
Durante a história, tudo aponta para um desfecho com grande impacto no MCU. A expectativa é bem construída. Mas a recompensa nunca chega. O clímax é previsível, sem coragem, e deixa a sensação de que a Marvel segue presa ao mesmo ciclo de prometer muito e entregar pouco.
No fim, Quarteto Fantástico: Primeiros Passos não é um desastre. Mas também não é uma vitória. É, ironicamente, o melhor filme do grupo até hoje, o que diz mais sobre o passado da franquia do que sobre os méritos deste longa.
Após um ótimo Thunderbolts*, a esperança de uma nova fase para o MCU parecia real. Mas o retorno à mediocridade faz tudo soar como mais um falso começo.
Nota: 6/10